O ano de 2024 apresentou desafios marcantes para a consolidação das garantias dos direitos das pessoas com deficiência no Brasil, especialmente no âmbito do Poder Judiciário. Apesar de avanços legislativos e da crescente mobilização da sociedade civil, a efetivação prática de tais direitos encontrou barreiras estruturais, culturais e administrativas que demandaram reflexões e ações estratégicas.
Um dos principais obstáculos foi a lentidão na tramitação de processos relacionados à acessibilidade e inclusão. Embora a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) tenha estabelecido direitos fundamentais para as pessoas com deficiência, muitos casos ainda enfrentaram demora excessiva, prejudicando a resolução de conflitos e a aplicação das leis. Essa situação revelou a necessidade urgente de uma maior sensibilização dos magistrados, além de investimentos em capacitações específicas para operadores do Direito.
Outro problema relevante foi a falta de acessibilidade plena nos tribunais brasileiros. Muitas unidades judiciárias não conseguiram atender às normas de acessibilidade previstas em lei, como adaptações físicas em prédios e a disponibilidade de recursos assistivos para pessoas com deficiência visual, auditiva ou motora. Essa falha gerou situações de exclusão que comprometiam o princípio da igualdade no acesso à Justiça.
Ademais, a interpretação de normas relacionadas aos direitos das pessoas com deficiência também foi alvo de questionamentos. Em algumas decisões judiciais, identificaram-se compreensões restritivas ou desatualizadas sobre o alcance da LBI e de convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU. Tal cenário ressaltou a importância de fomentar debates técnicos e ampliar a formação continuada de juízes, promotores e advogados.
Os direitos reprodutivos e a autonomia das pessoas com deficiência também ocuparam espaço nas discussões judiciais ao longo do ano. Casos envolvendo tutela e curatela frequentemente trouxeram à tona questões éticas e legais sobre a preservação da dignidade e da autodeterminação desses indivíduos. Apesar de avanços pontuais, como decisões favoráveis à liberdade reprodutiva e à autodeterminação, ainda persistiram interpretações paternalistas que desconsideravam o protagonismo das pessoas com deficiência.
Além disso, os direitos trabalhistas de pessoas com deficiência foram outra área desafiadora. A fiscalização insuficiente do cumprimento da Lei de Cotas e a resistência de algumas empresas em promover adaptações razoáveis impactaram diretamente o ingresso e a permanência de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Quando esses casos chegaram ao Judiciário, muitas decisões foram favoráveis, mas a ausência de medidas estruturais por parte de órgãos fiscalizadores e empregadores dificultou a implementação de mudanças efetivas.
Por outro lado, 2024 também foi marcado por decisões judiciais relevantes que reforçaram os direitos das pessoas com deficiência. Em alguns estados, houve precedentes que garantiram maior acessibilidade em concursos públicos, transporte coletivo e educação inclusiva.
Essas conquistas refletiram a importância de uma atuação judicial alinhada aos princípios constitucionais e aos tratados internacionais.
Ainda assim, a falta de uniformidade nas decisões judiciais destacou a necessidade de um diálogo mais consistente entre os tribunais e outros atores do sistema de Justiça. A criação de fóruns interinstitucionais e o fortalecimento de comissões voltadas aos direitos das pessoas com deficiência surgiram como iniciativas promissoras para enfrentar esses desafios.
No campo da tecnologia, o uso de plataformas digitais pelo Judiciário trouxe tanto avanços quanto novos obstáculos. Embora essas ferramentas tenham facilitado o acesso remoto a audiências e processos, sua implementação sem acessibilidade universal excluiu muitas pessoas com deficiência. Isso revelou a urgência de tornar os sistemas digitais mais inclusivos, atendendo às demandas de diferentes perfis de usuários.
Por fim, os desafios enfrentados em 2024 reforçaram a importância de uma abordagem proativa e multidisciplinar para garantir os direitos das pessoas com deficiência no Brasil. O fortalecimento da participação social, a valorização da educação inclusiva para os profissionais do Direito e a efetivação das políticas públicas foram apontados como caminhos indispensáveis para superar as barreiras existentes.
Ao refletir sobre o ano que passou, é essencial reconhecer que cada desafio também representou uma oportunidade para avançar na construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. O Poder Judiciário, como guardião dos direitos fundamentais, possui um papel crucial nesse processo e deve continuar a se adaptar e evoluir para atender às demandas de todas as pessoas, independentemente de suas características individuais.